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BEL/SBBE

Está frio. Gelado pra ser exata. É a primeira sensação que tenho ao passar pela porta de vidro automática. Ando pelo granito brilhoso toda feliz e ansiosa, pensando em todas as piadas e comentários que guardei pra esse momento. Todas envolvendo algo que vivemos sabe-se lá Deus quantos anos atrás. Mal sabe ele que essas lembranças me deram forças quando mais precisei. Observo o saguão enquanto subo pelas escadas rolantes. Há pessoas pra lá e pra cá puxando ou empurrando volumes, mas eu procuro apenas por aqueles com bolsas de colo, segura de que verei alguma logomarca Nikon. Um sujeito encostado no parapeito do outro lado me chama atenção. Nas mãos ele segura um telefone de flip quadradíssimo que o denuncia. Achei. Sigo ao seu encontro, mas agora bem, bem devagar. E lentamente vou anotando todas as pequenas diferenças que vejo ao observá-lo. Ele levanta a cabeça num movimento que declara que ele também está procurando algo. Levanto os braços e aceno, esperando que ele note. “olha pra cá

buraco de alfinete

Tu embalas a rede com os pés, mantendo os olhos fechados.  Tenho uma vontade louca de te esmagar num abraço. Me aninho ao teu lado sem dizer nada. Logo sinto tua respiração quente nos meus cabelos e penso nesse segredo que quero te contar. Hum-hum. De quando, no escuro dos meus pensamentos... eu te sinto nas minhas digitais e minha mente gira loucamente com imagens que mais parecem saídas de um livro de olho mágico – tão extraordinárias quanto os segundos luminosos do meu corpo em êxtase. Será que lembras? Daquele momento no qual te pedi abrigo e a luz incandescente dos teus olhos marcou minhas retinas límpidas, feito o flash daquela Canon cinza antiga. Sabes, às vezes preciso te dizer que era tudo real. Nunca precisei falsear os reflexos brilhantes das curvas dançantes na minha mente. Até agora, nesse momento de calmaria, enquanto a tarde atravessa as frestas... minha cabeça de enche de borrões coloridos. Lembras? Das nossas pernas entrelaçadas na sombra que a cortina produzia naquele

entre laços

Saio de casa nervosa. Ponho os óculos escuros que estão com as lentes arranhadas só para ter algo que esconda meu olhar. Vou andando apressada, mascarando a ansiedade com passos largos e amarrando meus cabelos de qualquer jeito, pois há muita tensão nos meus braços e não consigo me importar em como me pareço nesse momento – só quero que isso acabe. Os ruídos de um domingo festivo me atingem, mas não consigo prestar atenção à musica, pois minha mente está inundada por pensamentos revoltos com o rosto dele. Meu corpo estremece e dou uma risada irônica pensando em quantas vezes minha pele já reagiu loucamente ao toque, ao cheiro, à proximidade dele. Não me entenda mal, eu não o quero de volta. Não depois de ter assistido nosso relacionamento se deteriorar lentamente feito o teto e as paredes que dividimos naqueles anos. Não, não mesmo. Mas minha mente segue imaginando...  Mas chega disso! – grito mentalmente balançando os braços no ar como se estivesse curtindo o show que acontece logo al

chuva ligeira

Eu vim te olhando por entre meus cabelos. Pelas estantes de livros. Eu vim te olhando por entre as pessoas na fila. Eu simplesmente vim te olhando.  Silenciosamente meus olhos vem te pedindo que me olhes de volta. Silenciosamente meus olhos encontram os teus. Eu simplesmente desejo que vejas o que eu vejo. ... Veja. Em meus olhos eu te conto segredos. Conto-te histórias que ninguém mais sabe. Faço-te promessas que ninguém mais ouve. Ofereço-te o que precisas. Confesso-te...  ...  E por fim eu desvio o olhar, para que o segredo seja só meu novamente. E por fim eu escondo o que sinto para que não possas usá-lo contra mim. Silenciosamente te dou o primeiro e o último abraço. Silenciosamente te dou o primeiro e o último beijo. Eu simplesmente te dou adeus. ... Tu sorris. Tua boca me diz para não ter medo, que não há dor. Tua boca me diz para não sentir nada. Tua boca fala apenas do que está por vir. Tudo o que podes me dar, tudo o que eu quiser. ... E por fim te dou as costas, ignorando tu

Indícios

Levanto e acendo as luzes. Começo a tirar as roupas do canto onde estavam e passo a organizá-las, mas não sei bem se separo por cores, tamanho ou uso (casual, esporte e assim por diante). Minhas mãos e uma parte da minha cabeça se ocupam com isso, mas sei que só estou arrumando meu armário tamanha madrugada porque não consigo dormir e as sombras do meu quarto me fazem lembrar do que se esconde nas esquinas do meu coração. Mas não estou certa se é algo que consigo resolver... e quando há muito a fazer por dentro, começo por fora. Há muito mesmo o que fazer. Meias sem pares, calcinhas com elásticos frouxos e camisas com buracos que eu jamais percebi – deveria jogar fora? Não sei. São tão confortáveis.  Faço uma pilha disso para decidir depois. Há também fronhas e lençóis e algumas toalhas bem feias que mereciam virar pano de chão. E outra pilha (roupas que não cabem mais). E mais uma pilha (nunca usei/usarei). E já é de manhã.  Abro a janela pra sentir os primeiros raios do dia. Sento no

Cidade das Mangueiras

Correr sob o calor abrasador dessa cidade úmida e abafada me faz sentir estranhamente fora do lugar. Logo eu que julgava saber o significado do calor, sempre me descubro pensando “diabos de cidade quente!”. O reflexo do sol no chão cimentado tenta me cegar e o suor que escorre teima em me fazer parecer a pessoa mais desajeitada nesse final de tarde sufocante. Por um segundo eu praguejo contra a mãe natureza, embora no segundo seguinte esqueça completamente tudo ao avistar o início do muro de tijolos pintados em vermelho-terroso e sou inundada por pensamentos otimistas e motivadores que dizem: um passo a mais e uma inspiração profunda a menos. Estou chegando. Eu dobro a esquina e logo meus passos alcançam a soleira branca da porta marrom; desses marrons de madeira de lei antiga e pesada, dessas portas que parecem proteger os séculos que passam. A soleira branca da porta marrom da tua casa. Onde meu coração encontrou um lar. Ele se agita no peito e minhas mãos só faltam nadar no próprio

não titulado

É como se o ruído do vento nos meus ouvidos não significasse nada. O mesmo vale para a sensação de ardência que o frio e o movimento incontrolável dos meus cabelos provocam. A noite fria e escura me traz calafrios. Há tantas sensações, há tantos pequenos detalhes passando por meus olhos, encostando-se a meu corpo, mas eu simplesmente não consigo me concentrar em nenhum deles. Não quando meu estomago flutua, cheio e vazio ao mesmo tempo, recolhendo-se assustado antecipando a queda. Uma vontade quase incontrolável de correr, pular e cantar a música que toca no rádio nesse momento, tão grandiosa, tão igual ao ritmo vulcânico em meu peito, aquecido pelo choque e calor que teus olhos produzem. E pela primeira vez eu não tenho medo, não me sinto acuada. Não me importam as horas, nem a falta de luz. Não tenho ideia de para onde a estrada leva, nem quanto tempo levaremos para chegar lá. Eu quero sorrir, te dar a mais doce gargalhada deste universo. Quero que sintas como me fazes bem, o quanto